domingo, 19 de maio de 2013

Olhando

Ele tinha essa mania de olhar as pessoas. A esmo. Em qualquer lugar. De dentro do ônibus, do carro ou quando caminhava. Se divertia imaginando como viviam, aonde estavam indo…
O escritório onde trabalha fica no terceiro andar com uma varanda/terraço bem amplo. Ele gosta de debruçar no muro enquanto fuma e olhar a gente andando apressada lá embaixo. Um casal passa abraçado e os dois podem até não ser casados. A moça pode estar indo/vindo de algum motel barato com o amante enquanto o marido trabalha em algum canto da cidade. Ou também a está traindo…
O sujeito que espia disfarçadamente as pessoas que passam por ele, pode ser um ladrão analisando alguma provável vítima. Ou pode ser algum segurança contratado pelo comércio local…
Tantas possibilidades.
Tantos rostos sem nome.
Tantas pessoas que seguirão seus caminhos e que ele nunca conhecerá.
Tantas vidas que podem ser melhores que a dele.
Ou piores.
Então Ele percebe a garota numa loja em frente, um andar abaixo do seu. Parece uma loja de arranjos para festas. A fachada da loja é toda de vidro. Não tem janela. Tem uma espécie de porta que não leva pra lugar nenhum, já que não tem sacada. Ele a vê de corpo inteiro. Bonito corpo. Jeans e blusa curta com a barriguinha de fora. É, parece bonita. Mesmo de longe. Deve ter dezoito ou vinte anos. Mas tem cara de dezesseis. Como elas conseguem parecer ter dezesseis? Ele sabe que nunca terá essa resposta. Ela olha pra trás. Parece que alguém entrou na loja. Não, Ela volta a olhar pra rua. Os braços cruzados na altura dos seios. Parecem desafiar a lei da gravidade.
Da loja de festas, Ela vê um casal sentado num banco, conversando. A conversa parece séria, o que a deixa mais curiosa ainda. Ela quase entende o que estão falando. Tem certeza que não gostaria de ouvir o que dizem. Mas, tiraria o “encanto” da coisa. Sua imaginação é o melhor pra isso, já que assim pode fazer o casal brigar, discutir sobre uma viagem, combinar a festa do casamento…
O sujeito parado na sacada um andar acima do dela chama sua atenção por um instante. Ela imagina que seria engraçado se Ele estivesse fazendo a mesma coisa que Ela. A mesma “brincadeira” maluca de inventar histórias com as pessoas lá embaixo… Mas acha que ninguém é tão doido quanto Ela, e volta a olhar pra rua, seguindo os passos de uma garotinha de uns seis anos que caminhapuladança segurando a mão da mãe.
Sempre que volta à sacada, Ele não olha mais as pessoas.
Agora só olha pra Ela. E fica imaginando…

® Postado no Blog antigo em 23.09.2005

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